Assunto 10 - Direitos Reais Limitados

Material extraído da obra do professor Rafael de Menezes : https://rafaeldemenezes.adv.br/aulas/reais-na-coisa-alheia/8

 

No direito brasileiro o contrato, por si só, não basta para a transferência do domínio. Por ele criam-se apenas obrigações e direitos  (CC, art. 481). O domínio, porém, só se adquire pela tradição, se for coisa móvel  (art. 1.226), e pelo registro do título, se for imóvel (art. 1.227)  Desse modo, enquanto o contrato que institui uma hipoteca ou uma servidão não estiver registrado no Cartório de Registro de Imóveis existirá entre as partes apenas um vínculo obrigacional. O Direito Real, com todas as suas características, somente surgirá após aquele registro.

Conforme se depreende do CC, Art. 481. "Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro."

 

O Dir das Coisas divide-se em:

a) direito real ilimitado: é o chamado “jus in re propria”, ou direito na coisa própria, que é a propriedade, o mais amplo, complexo e importante direito real, já estudado no semestre passado.

b) direitos reais limitados: são os chamados “jura in re aliena”, ou direitos nas coisas alheias, ou seja, nas coisas de propriedade dos outros.

São vários os dir. reais limitados que nós vamos estudar este semestre, e que se subdividem em:

  1. direitos reais de gozo ou fruição, em que o titular tem a autorização de usar e gozar, ou tão somente usar de coisa alheia, abrangendo:

ENFITEUSE - Art. 2.038 - § 1o Nos aforamentos a que se refere este artigo é defeso:

I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações;

II - constituir subenfiteuse.

§ 2o A enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial.

Art. 1.225:

II - a superfície;

III - as servidões;

IV - o usufruto;

V - o uso;

VI - a habitação;

XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

        XII - a concessão de direito real de uso. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

A concessão de direito real de uso dá-se por ato administrativo vinculado ao poder público, sobre imóvel de propriedade da União Federal, ato que deverá ser levado ao registro imobiliário para que o direito real se constitua plenamente. Aplicam-se-lhe as regras do uso e do usufruto dos arts. 1.412 e 1.423 do Código Civil, naquilo que for compatível.

2) contratos com efeitos reais e

3) direitos reais de garantia.

Penhor

Anticrese

Hipoteca

 

O art. 1225 nos ajuda a conhecer os direitos reais em DOZE incisos. Acrescentem mais dois incisos neste artigo, a fim de conhecermos todos os direitos reais limitados:

- o inciso 7A, antes de penhor, que chamaremos de Direito Real de Preferência do Inquilino, previsto no art. 33 da lei 8.245/91;

- o inciso 10A, depois de anticrese, que chamaremos de Alienação Fiduciária em Garantia, prevista no Decreto Lei 911/69, e nos arts. 1361 a 1368 do CC.

Não existe direito real sem previsão em lei, ao contrário dos contratos que podem ser criados pelas partes, que podem ser atípicos (art 425).

Os DOZE incisos do art. 1225, menos a propriedade, que já conhecemos, e mais os dois direitos reais que mandei acrescentar, somam onze assuntos para estudarmos este semestre. Os incisos 2 a 6 tratam dos direitos reais de gozo ou fruição, os incisos 7 e 7A são obrigações reais ( = contratos com efeitos reais) e os incisos 8 a 10A tratam dos dir. reais de garantia.

Para Maria Helena Diniz (2009, p. 841):

Direitos reais limitados de gozo ou de fruição. Direitos reais limitados de gozo ou fruição são aqueles em que o titular tem a autoridade de usar e gozar ou tão-somente usar da coisa alheia, abrangendo: enfiteuse (CC, art 2 038), superfície, servidões prediais, usufruto, uso, habitação, concessão de uso especial para fins de moradia e concessão de direito real de uso Direitos reais de garantia. Nos direitos reais de garantia a coisa alheia dada como
garantia de débito, tais como: penhor, anticrese, hipoteca (Adeoas. n. 76 301. 1981), propriedade fiduciária, alienação fiduciária em garantia (CC, arts 1 361 a 1 368; Lei n 4 728/65, art 66, com alterações do Dcc-Lei n 911/69 e da Lei n 10 931/2004, e art 4“ da Lei n 6 071/74), ou, ainda, cessão fiduciária de direitos creditórios oriundos de contrato de alienação de imóveis (Lei n 9 514/97).


Direito real dc aquisição de imóvel: O compromisso irretratável de compra e venda de imóvel é um direito real de aquisição, desde que registrado, assecuracório não do contraher futuro, mas da outorga da escritura definitiva, não só em relação às partes contratantes, como erga omnes, visto que o promitente comprador poderá, com o pagamento integral do preço, exigi-la do promitente vendedor ou de terceiro a quem os direitos desse foram cedidos,
ou pleitear a adjudicação compulsória, havendo recusa daqueles.

 

 

 

CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS REAIS LIMITADOS

São estas características que tornam os direitos reais mais fortes, mais seguros, mais importantes do que os direitos pessoais (ex: uma hipoteca é superior a uma fiança; uma superfície é superior a uma locação, uma servidão predial é superior a uma obrigação de fazer, etc).

 

Algumas destas características são conhecidas do semestre passado, pois são características também da propriedade, mas outras características são novas, vejamos:

CARACATERÍSTICAS:

 

1 – SEQUELA: vem do verbo “seguir”. Em linguagem popular sequela é consequência, resultado, então quem sofre um acidente fica com sequelas pelo corpo. Já em linguagem jurídica, sequela é a faculdade do titular do direito real de exercer o seu poder sobre a coisa, não importa com quem esteja a coisa. Orlando Gomes compara a sequela à lepra e afirma que o direito real adere à coisa como a lepra ao corpo do doente.

Como a coisa objeto de direito real é individualizada, determinada, torna-se possível a perseguição (lembram do 475? Só dá pra fazer execução in natura pq a coisa é determinada). A sequela vem expressa no

art. 1228, “in fine”: o titular do direito real tem o poder de reaver a coisa das mãos de qualquer pessoa que injustamente a possua ou detenha. Não só o proprietário, mas qualquer titular de direito real tem sequela sobre a coisa.

EXEMPLO 1(ex: A pede um empréstimo ao Banco e dá um terreno em hipoteca; se A não pagar a dívida, o Banco vai executar o terreno, mesmo que o terreno  tenha sido vendido por A para um terceiro; o direito do Banco adere à coisa, não importa com quem esteja a coisa; a relação é com a coisa, é real (res = coisa) e não pessoal;

 Outro Exemplo: eu tenho uma servidão predial de vista, de modo que no terreno da frente do meu edifício só se pode construir casa, eis que um novo proprietário resolve construir um edifício, não vai poder pois a minha relação é com o terreno, e não com o dono desse terreno, seja A, B ou C). Isso é sequela! Mas para a sequela valer contra todos (efeito erga omnes) é necessário a publicidade, que é uma característica que veremos no final da aula.

 

2 – PREFERÊNCIA: esta característica não se aplica a todos os direitos reais, mas apenas aos direitos reais de garantia - DRG.

Os DRG são acessórios a uma dívida. Lembram da fiança? É aquele contrato acessório que não existe sem um contrato principal (ex: locação, mútuo) garantido pela fiança.

 

Pois bem, os DRG servem para garantir as dívidas só que com mais segurança do que a fiança ou o aval, pois já sabemos que os Dir Reais são mais poderosos do que os Dir Obrigacionais (= Pessoais).

 

E O QUE É PREFERÊNCIA? É o privilégio de obter o pagamento de uma dívida com o valor do bem dado em garantia aplicado exclusivamente à satisfação dessa dívida.

Ver 957 e 961 (obs: o crédito com hipoteca tem preferência sobre um crédito com fiança; já estudamos os privilégios creditórios em Civil 2, revisem este assunto). 

 

Então, se um Banco empresta dinheiro a José e pede uma hipoteca ou penhor, tais bens hipotecados ou empenhados serão as garantias do Banco, e tais bens serão vendidos para satisfazer o Banco caso José não pague a dívida no vencimento.

Art. 957. Não havendo título legal à preferência, terão os credores igual direito sobre os bens do devedor comum.

Art. 961. O crédito real prefere ao pessoal de qualquer espécie; o crédito pessoal privilegiado, ao simples; e o privilégio especial, ao geral.

 

 

3 – TIPICIDADE: esta característica se aplica a todos os direitos reais. Não há direito real sem previsão em lei, por isso se diz que os DR são típicos, numerus clausus (= fechado).

Já os contratos são numerus apertus, podem ser criados pelas partes (425). 

Os DR são aqueles do 1225 com os dois acréscimos que eu fiz, ambos previstos em lei, um no próprio CC (a alienação fiduciária em garantia) e outro na lei de locação. Por que essa diferença entre os DR e os Dir Obrigacionais? Porque os DR são mais poderosos, têm efeito erga omnes (contra todos), por isso só a lei pode criá-los. Se João me deve dinheiro, eu não posso cobrar a dívida de José ou Maria, apenas de João pois o direito obrigacional é relativo. Já a minha propriedade sobre esta caneta eu exerço contra todos vocês, vocês todos tem que respeitar o meu direito real de propriedade sobre meus bens, é um direito absoluto (erga omnes).

 

4 – ELASTICIDADE: é a qualidade dos DR que permite sua aquisição restitutiva.

 

Exemplificando, vocês lembram que a propriedade é a soma de três faculdades: uso, fruição e disposição. Então no usufruto, o usufrutuário adquire o uso e a fruição da coisa, enquanto a disposição permanece com o proprietário (1394). Ao término do usufruto, o proprietário readquire as três faculdades.  Com o usufruto o direito do proprietário diminuiu, mas depois tornou a crescer ao término do contrato. A mesma coisa na superfície, que  é mais do que usufruto, então o superficiário adquire o uso, a fruição e uma parte da disposição. Só a “metade” da disposição é que permanece com o proprietário até o término da superfície. Os DR são assim elásticos, eles se comprimem e se expandem, feito uma sanfona. Veremos em breve usufruto e superfície.

5 – PUBLICIDADE: importante característica, junto com a sequela. Todo DR exige publicidade, a fim de que todos tenham conhecimento.

SE A COISA É MÓVEL, a publicidade se dá pelo uso.

 

COISA É IMÓVEL, a publicidade se dá pelo registro no cartório de imóveis. Já falamos de registro no semestre passado, eu sei que vocês estão lembrados. Revisem registro de imóveis. Então propriedade imobiliária, superfície, usufruto, servidão predial, hipoteca, etc. só valem contra terceiros se estiverem devidamente registrados no

Ateh aki 6c em 01.09.14

Ateh aki 6ª em 02.09.14

 

 cartório do imóvel (1227). Sem o registro não há publicidade e assim não se pode exercer a sequela. Para os móveis não há registro porque os bens móveis são muito variados e menos valiosos, mas para os imóveis o Estado criou um registro organizado a cargo dos Cartórios de Imóveis, que são cartórios particulares mas fiscalizados pelo Tribunal de Justiça. Os DR em geral são imobiliários. Dos doze que vocês conhecem, poucos se aplicam aos móveis: propriedade, penhor, alienação fiduciária e raramente usufruto. Os outros oito são direitos imobiliários.

 

 

DIREITOS REAIS DE USO

A concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso foram incluídas no rol dos direitos reais do citado art. 1.225 do Código Civil pelo art. 10 da Lei n. 11.481, de 31 de maio de 2007, que prevê medidas voltadas à organização fundiária de interesse social em imóveis da União.

 

A CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA

Está assegurada pelo art. 183, § 1°, da Constituição Federal.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

A referida Lei n. 11.481/2007, por conseguinte, previu como direito real a concessão de uso especial, com a finalidade de operacionalizar o direito social de moradia e o de concessão de uso especial para fins de moradia. Trata-se de instituto que constitui decorrência da política urbana prevista na Carta Magna. A concessão de direito real de uso dá-se por ato administrativo vinculado ao poder público, sobre imóvel de propriedade da União Federal, ato que deverá ser levado ao registro imobiliário para que o direito real se constitua plenamente. Aplicam-se-lhe as regras do uso e do usufruto dos arts. 1.412 e 1.423 do Código Civil, naquilo que for compatível.

Do Uso

Art. 1.412. O usuário usará da coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as necessidades suas e de sua família.

§ 1o Avaliar-se-ão as necessidades pessoais do usuário conforme a sua condição social e o lugar onde viver.

§ 2o As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico.

Art. 1.423. O credor anticrético tem direito a reter em seu poder o bem, enquanto a dívida não for paga; extingue-se esse direito decorridos quinze anos da data de sua constituição.